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Luan e Daiana estudavam juntos no primeiro colegial. Na época colegial hoje,
ensino médio. Antes disso, só haviam se encontrado, um ano antes quando Luan
acompanhado por parentes foi até a casa de Daiana. Não se conheciam e houve
apenas um rápido aperto de mãos entre desconhecidos.
Passados
poucos meses estavam eles estudando juntos o primeiro colegial de uma
conceituada escola particular. No primeiro dia de aula, Luan estava fascinado
pelo ambiente do ensino médio pois não mais era obrigado a colocar uniformes
escolares. No ginásio, antigo ensino fundamental, na 8ª série, todos os dias
tinha que ir vestido com a camisa do colégio e uma calça de abrigo (azul
marinho). Estudava em um colégio, onde as regras eram rígidas. 7h10 aula de
religião, 8h matemática, 10h recreio, 11h educação física, 12h redação e assim
por diante. Por longos dois anos Luan foi submetido a esta rígida rotina. No
final estava até se acostumando.
Nesta
nova escola Luan disse a si mesmo que iria estudar mais e se divertir mais pois
não tinha muito boas lembranças do ensino fundamental. Ele, ainda fascinado,
olhando aos arredores para se familiarizar com o colégio, topou com uma colega
de classe, sorridente, que disse: “Você foi a minha casa um tempo atrás,
lembra?” Luan não reconheceu a colega, apenas respondeu com um “sim” meio “sim?”
na interrogação e saíram para o intervalo da aula.
Ao
retornar para a sala de aula, Luan, ainda pensativo não parava de pensar na conversa
anterior com a sua colega e ficava olhando, muito rapidamente para não ser
notado por ela, onde é que poderia ter conhecido esta menina. Estava intrigado
e ao final da aula, já se retirando da escola para a sua casa, novamente a
garota o abordou e disse com um belo sorriso: “Você não se lembrou de mim né?”.
“Vi que você ficou olhando, olhando com aquele ponto de interrogação na cara”.
“Eu sou a Daiana”. “Você foi na minha casa algum tempo atrás”. “Acho que você
não me reconheceu pois naquela oportunidade eu estava usando óculos”. Luan não
se conteve e disse: “você usa óculos?” e ela: “Sim, hoje estou com lentes de
contato”. Seria uma coincidência muito grande? Conhecer Daiana e estudar na
mesma classe alguns meses depois? A cabeça de Luan começava a funcionar e seus
demônios desta sua cabecinha não mais o deixaria em paz.
E
foram embora, cada um para a sua casa com uma boa impressão do primeiro dia de
aula. Luan feliz, porém ao mesmo tempo intrigado, por ter conhecido ou
reconhecido Daiana, e Daiana também feliz por ter feito o dever de casa e feito
com que Luan se lembrasse dela.
O
tempo foi passando e Luan, ainda como havia prometido para ele mesmo, se
esforçava para tirar notas boas, estudando muito e quase sempre cumprindo seus
objetivos. Daiana tirava boas notas sem se esforçar. Gostava de literatura. Lia
livros de romance mesmo sem serem os livros indicados pelo professor. Gostava
de participar da aula. Já Luan se esforçava para tirar boas notas, não gostava
de literatura e ficava escondido no meio da sala a fim de que não fosse notado
pelo professor. Mas era um rapaz boa pinta. No intervalo gostava de interagir
com os colegas, principalmente com os colegas que ele já conhecia dos colégios anteriores.
Era brincalhão, mas tinha aquele velho problema de interagir com as garotas.
Aos 15 anos o que ele mais queria era jogar bola, sair com os amigos, praticar
natação e torcer para o Timão. No final dos anos 80, o time do Corinthians era
tenebroso. Era difícil torcer para este time. Ganhava um campeonato a cada 3 ou
4 anos e nunca tinha ganho um campeonato Brasileiro. Mas enfim era o time que
ele gostava e sofria muito com isso.
Aos
poucos começou a conversar um pouco mais com Daiana e a amizade foi crescendo.
De vez em quando ela o convidava para estudar na sua casa, com outros colegas
de classe, somente para passar mais tempos juntos. Pois, na época Luan não
sabia, mas Daiana não precisava de grupos de estudos. Ficava admirando o
esforço de Luan em estudar e ensinar os outros colegas e de vez em quando,
fazia que não entendia para que o próprio lhe ensinasse. Mas ela nunca
precisou. Não se esforçava. Ela era inteligente por natureza. Luan também
aproveitava os momentos para ensinar e estudar junto. Gostavam um da companhia
do outro. Não foram raras vezes que Luan foi estudar na casa de Daiana. Foi o
mais próximo que conseguiram chegar quando dividiam a mesma sala de aula. Nunca
falaram em namoro, em namorar, nada. Apenas Daiana falava que era difícil um
homem ser amigo de uma mulher ou vice-versa. Luan não concordou com isso, e
ficaram em um impasse.
Certa
ocasião, Luan estava a caminho de casa após um treino de natação, já noite, e de
repente encontrou Daiana com uma amiga. Mais uma vez coincidência? Elas iriam
até um hotel da cidade onde uma banda de rock estava hospedada. Nem deu tempo
de Luan dizer nada e, quando percebeu, já estava dentro do carro, um fusquinha,
conduzido pela amiga de Daiana. Foi meio que um sequestro relâmpago, mas um
sequestro que Luan curtiu muito. Ele que não gostava muito música e ouvia pouco
rock, mas não se importou de ir junto com Daiana. O importante era estar na
companhia dela. No hotel não havia quase ninguém. O papo com os músicos fora
muito legal, pegaram autógrafos, conversaram, riram e se despediram. Como não
levaram papel e caneta para os autógrafos, a agenda de Luan serviu para quebrar
o galho. Naquela época Luan já nutria um grande amor platônico por ela. Daiana
também gostava de Luan, porém um inimigo implacável estava prestes a surgir
entre os dois. O tempo!
Não
houve uma despedida. O ensino médio foi passando e já no cursinho, em uma outra
escola, quase não se falavam. Não porque brigaram ou tivesse acontecido algo
entre eles. Apenas estavam preocupados com o vestibular e quando se encontravam
apenas se cumprimentavam brevemente. Naquele momento nem passava pelas suas
cabeças se envolverem pois, além de serem muito jovens, existiam outras
prioridades nas suas vidas.
Neste
último ano de cursinho foi a penúltima vez que se viram. Um longo espaço de
tempo estava prestes a ficar entre eles. Esta situação acontece com amigos de
ensino médio. Durante o colégio eles se tornam amigos, dividem o lanche, jogam
futebol e até dormem um na casa do outro, riem das mesmas coisas. Em um outro
momento vão se distanciando até que se tornam apenas mais um rosto desconhecido
nos corredores da escola e depois, esquecidos no decorrer da vida.
Luan
e Daiana fizeram faculdades diferentes, em cidades diferentes e raramente um
tinha notícia do outro. Casaram-se com outras pessoas que conheceram e
constituíram família.
Em
um breve momento, 15 anos depois, tiveram mais um contato em uma formatura.
Trocaram olhares e perguntaram se estavam bem. Esta foi a última vez que se
viram.
O
mundo dá voltas e amizades verdadeiras transcendem o tempo. O tempo pode ser um
inimigo oculto muito feroz, porém o amor e a grande amizade entre duas pessoas
podem perpetuar, deixando assim o tempo parado, congelado. E o tempo congelado,
fica para sempre, como uma fotografia. Fica mais ou menos como uma lembrança
para a vida afora. Os anos passam, as pessoas ficam mais velhas porém este
espaço de tempo mesmo sendo considerável não será, ou seria, suficiente para
separar dois velhos amigos.
Um
certo dia, passados mais de 23 anos do cursinho, voltaram a se encontrar
virtualmente em uma rede social. Para Daiana foi um encontro normal e casual
entre dois amigos. Para Luan, despertou o sentimento da adolescência,
inexplicável até mesmo para ele que sempre foi um rapaz sensato e racional.
Recuperar 23 anos em poucos dias é difícil, porém fica a cargo do tempo em
reparar o que ele fez.
Para
Luan era como ter uma sementinha guardada no coração e ao “reencontrar” Daiana,
esta sementinha se aflorou e houve uma explosão de sentimento. Luan, agora
desimpedido e sabendo que Daiana estava divorciada, o fez lembrar do tempo de
colégio onde eram bons amigos. Ainda não se encontraram para conversar e trocar
as boas novas. Mas isso agora não é o mais importante. Luan lembrou-se de
Clarice Lispector no conto felicidade clandestina. Ao receber um e-mail ou
curtida em rede social faz despertar a sua felicidade clandestina. O recado
dela está lá. De vez em quando ele olha, não abre, sai do e-mail, confere mais
uma vez, demora para ler, e, enfim a lê com muito mais interesse.
E
assim, esta felicidade pode ser duradoura e que eles possam passar mais 23 anos
sem se verem, pois, a amizade e o sentimento recíproco permanecerão para
sempre, sempre!
Um
certo dia, cansado de só poder comunicar com Daiana virtualmente, Luan, enfim,
tomou coragem e enviou-lhe uma mensagem dizendo que gostaria de revê-la.
Passados alguns dias veio a resposta. Luan, se torturou por algum tempo para
abri-la e lê-la. Quando achou que já havia esperado tempo suficiente, respirou
fundo, clicou na mensagem e começou a ler. A resposta de Daiana foi:
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