quarta-feira, 8 de março de 2017

Zygmunt Bauman e a questão dos refugiados

            Zygmunt Bauman, filósofo polonês recentemente falecido, disse em uma entrevista sobre o envolvimento das pessoas com seus semelhantes no mundo de hoje. As pessoas na era da informática, são descartáveis facilmente em apenas um clicar e as relações humanas que outrora eram feitas através do contato, são “coisificadas” e assim, o rompimento de uma relação fica mais acentuado. Ele diz também que amigos das redes sociais são ilusão, pois na vida nos relacionamos com certo número de pessoas que nos auxiliarão na caminhada pela vida e que ter milhares de amigos virtuais não significa nada, a não ser que pode ser facilmente descartados conforme discutido anteriormente.

            Bauman foi auto de vários livros dentre eles modernidade líquida, amor líquido. Nestes livros ele discute principalmente as incertezas do capitalismo, onde as pessoas hoje prezam mais o consumo e a produção acelerada e sendo assim, as relações afetivas são afetadas pela mudança neste estilo de vida, onde não há mais solidez nas relações humanas, daí as incertezas do capitalismo.
O consumismo e a produção acelerada, muitas vezes em detrimento ao meio ambiente, promove alterações nas relações humanas, principalmente no fenômeno das redes sociais. As pessoas buscam felicidade rápida, satisfação dos desejos de forma acelerada, menos duradouros e menos profundos, e como consequência grande transformações na família moderna.

            No livro - amor líquido Sobre a fragilidade dos laços humanos - Bauman discute o relacionamento humano. “O principal herói deste livro é o relacionamento humano. Seus personagens centrais são homens e mulheres, nossos contemporâneos, desesperados por terem sido abandonados aos seus próprios sentidos e sentimentos facilmente descartáveis, ansiando pela segurança do convívio e pela mão amiga com que possam contar num momento de aflição, desesperados por “relacionar-se” e, no entanto desconfiados da condição de “estar ligado” em particular de estar ligado “permanentemente” para não dizer eternamente, pois temem que tal condição possa trazer encargos e tensões que eles não se consideram aptos nem dispostos a suportar, e que podem limitar severamente a liberdade de que necessitam para — sim, seu palpite está certo — relacionar-se... Em nosso mundo de furiosa “individualização”, os relacionamentos são bênçãos ambíguas. Oscilam entre o sonho e o pesadelo, e não há como determinar quando um se transforma no outro. Na maior parte do tempo, esses dois avatares coabitam embora em diferentes níveis de consciência. No líquido cenário da vida moderna, os relacionamentos talvez sejam os representantes mais comuns, agudos, perturbadores e profundamente sentidos da ambivalência”.

            A abordagem sobre questões da era da internet, informatização da vida e a velocidade de informações, a maioria das vezes sem conteúdo, são discutidos por Bauman. Os estímulos rápidos e o bombardeamento de informações acaba transformando a nossa forma de enxergar o mundo, sendo que muitas vezes as pessoas não corresponderão a essas velocidades de informações e o atendimento das expectativas criadas.

          Essas relações são permeadas pela facilidade de conectar e desconectar. A vantagem das relações na modernidade líquida é a facilidade de descartar e tirar responsabilidade, ou seja sair da relação quando não está atendendo as expectativas, velocidades e anseios rápidos da modernidade.

            Com a mudança no comportamento social, as questões sociais acerca os refugiados também são afetadas. Com as relações humanas cada vez mais distantes. Ainda segundo Bauman em seu livro “Strangers at our door” os europeus veem os refugiados não somente como estrangeiros, mas como estranhos. O grande número de imigrantes desalojados, pobres, famintos e com matrizes culturais muito diversas da europeia tem gerado nos países de destino uma sensação de estranheza e um temor difuso. A Europa estaria sob a crescente sensação de ameaça aos seus referenciais culturais, aos padrões civilizatórios da cristandade ocidental e às respectivas identidades nacionais. Os refugiados, em sua maioria muçulmanos, além de encargos socioeconômicos, são percebidos como uma ameaça ao modus vivendi europeu. O grande contingente de migrantes estaria comprometendo a crença europeia em uma homogeneidade nacional. Nesse ponto, Bauman está denunciando a persistência cultural do pensamento do constitucionalista alemão Carl Schmitt (1888-1985), contido em obras como Teologia Política e o Conceito do Político, em que povo é conceituado como uma comunidade de destino, que se diferencia dos demais povos exatamente por sua homogeneidade política interna. Esse é o fundamento do conceito étnico-cultural de cidadão, defendido por Schmitt e que parece estar no inconsciente coletivo europeu, explicando a estranheza e ameaça “sentidas” diante dos refugiados muçulmanos.

            No texto Bauman ainda faz referências à crescente fortalecimento da extrema direita por conta do fundamentalismo terrorista, alegadamente islâmico, a fim de combater a “invasão muçulmana”, encontrando repercussão nas pautas de agentes políticos e da grande mídia.


            Por fim, em um mundo líquido, onde as pessoas ficam cada vez mais distante uma das outras ou seja são “coisificadas”, Bauman ainda discute que toda a humanidade deve assumir sua responsabilidade política, social e humanitária para com os refugiados e defende ainda que o refugiado seja compreendido, não como um estranho, mas como nosso Outro, pelo qual somos responsáveis.

Referencias:

http://www.fronteiras.com/artigos/zygmunt-bauman-o-medo-dos-refugiados
https://jota.info/artigos/ultima-licao-de-bauman-10012017
https://www.youtube.com/watch?v=LcHTeDNIarU

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